O Conselho Federal de Farmácia (CFF) aprovou recentemente uma resolução que autoriza farmacêuticos a prescreverem medicamentos em determinadas situações, com a justificativa de ampliar o acesso da população a tratamentos de saúde, principalmente em regiões onde há escassez de médicos. A medida, já publicada no Diário Oficial da União, reacende um importante debate sobre os limites do exercício profissional em saúde e a preservação do ato médico, regulamentado pela Lei nº 12.842/2013.
Segundo o Dr. Eduardo Amoras, RT de Cirurgia Pediátrica do Hospital Oncológico Infantil Octávio Lobo e Diretor de Comunicação do Sindicato dos Médicos do Pará (SINDMEPA), o ato de prescrever medicamentos é um dos pilares da prática médica, pois exige um diagnóstico preciso, avaliação clínica e um histórico de comorbidades e particularidades de cada paciente. “A prescrição não pode ser vista apenas como a indicação de um fármaco, mas como parte de um processo complexo que começa na anamnese, passa pelo exame físico e resulta na escolha do tratamento mais seguro e eficaz”, ressaltou.
O que diz a Lei do Ato Médico?
A lei é clara ao estabelecer que a prescrição de medicamentos é uma atividade privativa do médico, exceto nos casos de prescrições já estabelecidas por protocolos de saúde pública, como ocorre com alguns profissionais da área de enfermagem e odontologia, dentro de limites legais bem definidos. “A autorização indiscriminada para que farmacêuticos prescrevam pode gerar sobreposição de funções, fragmentação da assistência e, mais grave, riscos à saúde do paciente, especialmente em contextos onde não há supervisão médica direta”, explica Dr. Eduardo Amoras.
“É importante reconhecer o papel essencial do farmacêutico no cuidado em saúde, especialmente na orientação quanto ao uso racional de medicamentos. Contudo, isso não deve ser confundido com a função de diagnosticar e prescrever, que exige competências próprias da formação médica”, continuou.
A escassez de médicos em determinadas regiões é um problema real e grave, que deve ser enfrentado com políticas públicas voltadas para a ampliação do acesso a cuidados médicos. Transferir a responsabilidade da prescrição para outros profissionais como solução paliativa pode gerar um falso senso de acesso e segurança, comprometendo a qualidade do atendimento.
O Sindmepa ressalta que é fundamental que qualquer medida que envolva a ampliação de competências na área da saúde respeite os limites legais do exercício profissional, seja pautada no diálogo interprofissional e, sobretudo, tenha como foco central a segurança e o bem-estar da população. A saúde pública brasileira precisa de soluções estruturais e integradas, e não de atalhos que, embora bem-intencionados, podem trazer consequências indesejadas.