Após denunciar as péssimas condições de trabalho e de funcionamento do HPSM do Guamá em seu perfil no facebook, na semana passada, o médico Jessé Soares vivenciou uma experiência inédita: foi demitido pelo diretor clínico do hospital Daniel Werneck e duas horas depois readmitido pelo próprio prefeito, Zenaldo Coutinho, em ligação para o seu celular. “Já esperava ser demitido, mas não esperava que ele me ligasse para me readmitir”, disse à reportagem da assessoria de imprensa do Sindmepa nesta sexta-feira, 18, ao assinar a ficha de filiação do sindicato: “Me sinto mais seguro sendo sindicalizado”.
Aos 27 anos, Jessé é uma daquelas pessoas que já nasce com a vocação no sangue. Queria ser médico desde menino. Morando em Limoeiro do Ajuru, mudou-se para a capital do estado para estudar na Universidade Estadual do Pará (Uepa). Aprovado em medicina, teve que vender bombons nos ônibus que circulavam em Belém para concluir o curso. Ingressou na universidade em 2009 e saiu em maio de 2015. Atrasou um semestre.
Dois meses depois já tirava plantão no Guamá. “Eu já tinha ido ao PSM do Guamá uma noite levar minha filha para ser atendida, e já achei lotado. Mas nada parecido com o cenário que vi depois quando fui trabalhar”, relembra o médico. “Tiraram os bancos da sala de espera para colocar macas. Me senti numa zona de guerra e a gente (médicos) sendo linha de frente”, desabafou. Atuando na internação, onde ficam os casos mais graves, Jessé afirma que o médico precisa respirar fundo quando tem que ir ao Acolhimento. “Atravessar o Acolhimento é terrível, porque o hall de entrada do hospital tá cheio de paciente internado”.
O plantão do último sábado, no Guamá, foi a causa da completa indignação do médico. “Tinha me sentido impotente no plantão diante de tanta gente em estado grave, comatosos, sem poder fazer nada. Vi na televisão que a prefeitura tinha inaugurado o PSM da 14, mas só pra inglês ver. Aquilo me revoltou, aí decidi denunciar”, disse.
A denúncia no facebook gerou uma repercussão inesperada. Milhares de comentários e compartilhamentos, seguido de entrevista para a imprensa. Na segunda-feira seguinte, saiu de casa cedo para levar o currículo em uma unidade de saúde de Ananindeua e um hospital particular. “Sabia que não teria mais trabalho na Prefeitura de Belém”. No mesmo dia recebeu a ligação do diretor clínico do hospital para informá-lo da decisão da Sesma em desligá-lo de todos os plantões que prestava ao município. Além do hospital do Guamá, do Samu e unidade do Telégrafo.
“Disseram que eu estava proibido de tirar plantões pela Sesma. E que talvez nem recebesse os plantões que já tinha tirado. Respondi que ia procurar meus direitos”. Depois de dar entrevista para o jornal O Liberal, duas horas depois de ser demitido, recebeu a ligação do prefeito para a readmissão. “Ele disse que não concordava com retaliações e ‘tava’ solidário comigo”, contou.
Hoje, ao procurar o Sindmepa para se sindicalizar foi recebido pelos diretores Wilson Machado e João Gouveia e assinou a ficha de filiação. “Sei que sindicalizado estou mais seguro”, disse. Se preparando para a prova de residência em neurocirurgia no final do ano, alterna plantões em Belém e Abaetetuba com os estudos para a prova. Ele espera que a reabertura do PSM da 14 se concretize de fato e não seja “só pra inglês ver”.